terça-feira, 29 de julho de 2014

O SAGRADO E O PROFANO

Por Eduardo Fontenele
 
São Cipriano, paradoxalmente, foi um bruxo temido e um santo católico, tudo em uma única pessoa. Uma vida regada a perversões, ocultismo e uma estreita relação com Lúcifer e Satanás. Já Rodolfo Abrantes foi vocalista e compositor da banda de rock brasileira Raimundos, hoje é pastor de uma igreja evangélica. O que os dois têm em comum? Só uma vida de libertinagem e uma conversão posterior ao cristianismo para expurgar o passado.

São Cipriano

Cipriano, ou Tascius Caecilius Cyprianus, era também conhecido por “O Bruxo” ou “O Feiticeiro”, nasceu em 250 d. C., na Antioquia, região situada entre a Síria e a Arábia Saudita, pertencente ao governo da Fenícia. Desde muito jovem teve sua vida direcionada para o estudo do ocultismo. Aos 30 anos foi estudar com a bruxa Évora, esta faleceu, devido à idade avançada, e lhe deixou como herança seus manuscritos, nos quais ele se debruçou e aperfeiçoou seus conhecimentos sobre magia negra. Cipriano era versado em alquimia, astrologia, adivinhação, numerologia hebraica, feitiçaria, invocação de espíritos e rituais de sacrifício.
Certo dia, um jovem rico de nome Aglaide, que se encontrava apaixonado por uma jovem bela, e igualmente rica, chamada Justina, lhe procurou para que o bruxo fizesse um trabalho de feitiçaria para forçar Justina a casar-se com ele. Justina era uma moça de fé inabalável em Deus e que decidira não se entregar a homem nenhum. Cipriano fez inúmeras tentativas de persuadir a jovem através de magia negra, mas esta sempre se defendeu com orações e o sinal da cruz. Desiludido com a derrota inédita em sua carreira como ocultista respeitado, Cipriano perdeu a convicção em seu poder e decidiu tornar-se cristão.
Cipriano passou de pecador a entusiasta da fé católica. O Imperador romano chamado Diocleciano, que costumava perseguir cristãos, mandou aprisioná-lo e torturá-lo até que negasse sua fé. Assim como Justina também fora aprisionada e torturada. Não importava que tipo de tortura fosse empregada, os dois prisioneiros sempre se mantinham íntegros em suas convicções. Derrotado pela resistência pacífica dos dois cristãos, o imperador ordenou que fossem decapitados em 26 de Setembro de 304 d. C. Os dois mártires foram considerados santos após suas mortes. São Cipriano deixou como legado o livro escrito antes de sua conversão, o Livro de São Cipriano de Capa Preta, um tratado de magias branca e negra.
Onde quero chegar com toda essa explanação sobre a vida de São Cipriano? O objetivo é fazer um paralelo com a vida do roqueiro brasileiro, ainda que Rodolfo não seja exatamente católico e sim evangélico, nem tenha se desvirtuado tanto do bom caminho como o santo controverso.
O roqueiro nasceu em Brasília em 20 de setembro de 1972, filho de médicos paraibanos, seu nome completo é Rodolfo Gonçalves Leite de Abrantes, cresceu sob a influência de duas culturas, a música dos punks norte-americanos Ramones e o forró do cantor e sanfoneiro pernambucano Zenilton. As letras de Zenilton são caracterizadas pelo duplo sentido, pelos trocadilhos sexuais, pelo humor e malícia.
Na adolescência, em 1987, Rodolfo fundou o Raimundos junto com seu vizinho e amigo Digão, que inicialmente tocava bateria ao invés da guitarra, para o baixo chamaram Canisso. Rodolfo tocava guitarra e cantava. A banda tocava apenas covers dos Ramones, depois passaram a compor seu próprio repertório autoral. Nascia o forrocore. A estreia foi na passagem do ano de 1988, na casa do amigo dos integrantes Gabriel Thomaz (atualmente líder da banda Autoramas). A banda se dissolveu em 1990.
Raimundos
Em 1992 a banda retornou do hiato de dois anos, mas faltava um baterista fixo, já que Digão enveredara para a guitarra por causa de problemas auditivos e Rodolfo agora estava só nos vocais. Estavam utilizando-se de uma bateria eletrônica. Decidiram recrutar para a bateria um fã da banda, Fred, assim se deu a formação clássica da banda.
ENVOLVIMENTO COM AS DROGAS E LETRAS IRÔNICAS FIZERAM PARTE DA TRAJETÓRIA DA BANDA
Era a década de 90 e o rock brasileiro renascia após a ressaca provocada pelos excessos da geração passada. Na geração pós-ditadura, a de 80, as drogas, principalmente a cocaína, tiveram um protagonismo que definiu o estilo de vida dos astros do rock nacional. Lobão, Ritchie, Arnaldo Antunes (Titãs), Nando Reis (idem), João Gordo (Ratos de Porão), Cazuza (Barão Vermelho), Dinho Ouro Preto (Capital Inicial), Nasi (Ira!), Renato Russo (Legião Urbana), entre outros, foram usuários contumazes de drogas e quase se afundaram devido ao vício. Com Rodolfo foi um coquetel que embalou suas noitadas, o músico utilizou-se de ecstasy, cocaína, maconha e LSD.
As letras do Raimundos faziam apologia ao sexo promíscuo, à pornografia, ao machismo, às drogas, à coisificação da mulher, os palavrões eram fartamente empregados e havia a predominância de conteúdo autobiográfico, tudo amarrado com muito humor, e uma pegada hardcore punk na parte instrumental. Como neste trecho da canção Puteiro em João Pessoa, presente no álbum de estreia da banda, intitulado simplesmente de Raimundos (1994):
♫ Meu primo me olhou de lado e disse: "coitado"
Era uma quenga fedorenta, daquelas das mais nojentas
Mas se você não aguenta, você leva para o quarto
Ela pegou no meu pau, pôs a boca e depois ficou de quatro
Foi num puteiro em João Pessoa
Descobri que a vida é boa
Foi minha primeira vez♫

Há também a letra ainda mais explícita de Selim, também do álbum de estreia da banda:
♫ Eu queria ser o banquinho da bicicleta
Pra ficar bem no meio das pernas
E sentir o seu ânus suar
Eu queria ser a calcinha daquela menina
Pra ficar bem perto da vagina
E às vezes até me molhar
Mas eu não sei o que se passa nesta cabecinha
É claro que era da minha
Você não pode duvidar
fica quieto
Não me deixe envergonhado
Pois se eu ficar excitado
Minha calça vai estourar♫
E este trecho da escatológica Reggae do Manêro, um dos clássicos da banda, do álbum MTV ao Vivo (2000), o último disco do Raimundos com a participação de Rodolfo. Como o título da canção evidencia, trata-se de um reggae, um ritmo atípico no repertório da banda:
♫ Ô mãe! Vê se me manda um dinheiro
Que eu tô no banheiro
E não tem nem papel pra cagar
Ô mãe! Esse seu filho é maneiro
Aqui no estrangeiro nenhuma mulher
Quer me dar♫
Em junho de 2001, Rodolfo virou evangélico, entrou para a igreja Bola de Neve, influenciado por sua esposa Alexandra Horn, e abandonou o Raimundos. Atualmente, com uma nova formação, a banda luta para permanecer em evidência no cenário nacional, após um passado de glórias, sendo citada como uma referência por muitas outras bandas surgidas depois dela.

Rodolfo

Após sua saída da banda, Rodolfo formou o Rodox, que lançou dois discos, Estreito (2002) e Rodox (2003), mas não vingou, pois os outros integrantes da banda não concordaram em se converter à sua fé. Hoje, Rodolfo, além de comandar o culto em sua igreja, é palestrante e mantém uma carreira como artista gospel solo. Nas horas vagas, pega onda nas praias de Balneário Camboriú (SC), onde vive hoje.
HOMENS DE FASES, FÉ E POLÊMICAS
Recentemente houve uma troca de farpas entre Rodolfo e seus ex-colegas de banda Digão e Canisso, após a publicação de uma entrevista de Rodolfo para a revista Trip, Rodolfo se declarou arrependido de ter escrito as principais letras do Raimundos e da vida que levava na época em que liderou a banda, causando revolta por parte dos atuais líderes da banda, como Digão, que   desabafou no Facebook, irritado:


“100% arrependido’ mas usufruindo 100% da sua parte dos direitos autorais e que não é uma ‘merreca’ que ele gosta de falar para os desinformados... Se ele pode se dar ao luxo de sair de casa pra ‘trabalhar’ e não receber nada, quem banca isso?! O Raimundos é claro, a sua eterna previdência privada, assim como o chamariz de seus testemunhos ‘Eterno ex-Raimundos’. (...) Sem contar o fato dele não ter respeitado os nossos direitos quando saiu da banda, o que me cansa é essa insistência em associar o Raimundos às coisas ruins e o seu uso de pó e outras drogas pesadas em sua vida! Amparado pela verdade e Deus é minha testemunha, isso foi fora do Raimundos com as ‘nega’ dele! Muito me admirei quando vi suas declarações, pois nunca tinha visto isso dentro da banda!”  Fonte: http://wiplash.net/materias/news 814/205059



Rodolfo respondeu em comunicado oficial publicado pela mesma publicação onde havia dado as declarações anteriores, desculpando-se por suas declarações:
“Nunca foi minha intenção denegrir, expor ou culpar qualquer pessoa pelos problemas que tive no passado que não fosse eu. Por isso, minhas sinceras desculpas aos fãs e integrantes do Raimundos, que possam ter levado para esse lado. (...) Na cultura do ambiente cristão, arrependimento verdadeiro significa basicamente duas coisas. Primeiro, não voltar a fazer o que fazia. Jesus disse isso pra muitas pessoas, ‘vá, e não peques mais’. A segunda é, mostre frutos de arrependimento, ou seja, ‘faça diferente’. Quando disse estar ‘100% arrependido das músicas que escrevi’, foi nesse sentido, pois é isso que tenho tentado cumprir como alguém que crê em Jesus. Arrependimento verdadeiro não é remorso, ele não aponta pro passado numa tentativa inútil de tentar apagá-lo. Ele aponta pro futuro, tipo ‘daqui por diante, bola pra frente’. Meu maior arrependimento é o de ter tido, por um período de tempo, uma geração me ouvindo, e não tê-la edificado como gostaria, pois, naquela época, eu não tinha o entendimento que tenho hoje.”
Canisso declarou em seu Twitter:
“Uma puta contradição, a gente rala pra caralho pra manter a banda em evidência e pingar um dinheiro de direito autoral na conta do infeliz. Pro cara pagar de surfista-pastor-popstar arrependido de Camboriú... devia ter a humildade de demonstrar agradecimento (...) Passam os anos e nada, nosso Rodolfo morreu mesmo... Triste, não conheço esse parvo aí! (...)”
Agora Rodolfo esclarece a questão dos direitos autorais e de como se mantém financeiramente em sua nova vida:
“Sinto também que devo, de forma abreviada, explicar como recebo direitos autorais. Desde 1994 recebo royalties pelas canções que escrevi ou tive participação. Sou compositor e essa é minha principal fonte de renda. É lícito, é digno, me permite pagar tributos e me permite servir à igreja voluntariamente, por amor e sem precisar cobrar altos cachês.”
Fonte: Raimundos: Comunicado oficial de Rodolfo Abrantes sobre polêmicas http://wiplash.net/mateiras/news 814/205140-raimundos.html#ixzz36n3pViB2
Digão o chamou de hipócrita e rebateu:
“Se o Rodolfo não se lembra, os fãs menos ainda porquê tudo o que ele fez fora do Raimundos não tocou ou toca em rádio. Shows em cultos como os que ele faz o ECAD também não recolhe, pois igrejas não pagam impostos, eu liguei pra conferir. O grosso do que ele recebe (95% pra mais) vem do Raimundos, portanto, o Rodolfo dizer de cara lavada ‘eu não vivo às custas do Raimundos’ só eleva a hipocrisia dele a níveis astronômicos...”
A resposta de Rodolfo, dizendo-se perseguido por causa de sua fé:
“Também entendo que num país onde vivemos uma declarada perseguição religiosa (e todo esse barulho é 100% por causa da minha fé) é quase que prazeroso chamar um cristão de hipócrita. Nada que eu nunca tenha ouvido, aliás, há 13 anos é o mais leve que ouço. Não sou, nem tento passar a ideia de alguém perfeito. Sou, sim, um pecador que é totalmente dependente da misericórdia de Deus. Espero melhorar com o tempo, e peço ao Senhor que me dê mais sabedoria quando falar”.
Fonte: http://revistatrip.uol.com.br/so-no-site/notas/rodolfo-abrantes-responde-criticas.html
Rodolfo concluiu, sem rancor:
“Desejo uma vida longa ao Canisso a ao Rodrigo. Vocês podem pensar o que quiserem de mim, mas nunca vão se livrar das orações que faço, e continuarei fazendo, em favor de vocês.”
Fonte: http://revistatrip.uol.com.br/so-no-site/notas/rodolfo-abrantes-responde-criticas.html
A polêmica com os antigos colegas está servindo mais para recolocar a banda nas manchetes e para divulgar a nova carreira do agora artista solo/pastor Rodolfo do que para criticar esse ou aquele estilo de vida.
Ao que parece, tanto São Cipriano quanto Rodolfo enfrentaram dificuldades em sua passagem da vida mundana para a ascética, devido à intolerância (no caso do santo católico) e devido ao seu passado (no caso do músico).  
*Um agradecimento especial a Laila Araújo Coelho pelas críticas pertinentes e por me instigar a reescrever este texto e melhorá-lo, enfatizando a clareza e a precisão das informações.
 

terça-feira, 15 de julho de 2014

GARAGE INC DISCO DUPLO DO METALLICA

Por Laila Araújo Coelho

Para os fãs da banda Metallica que querem ter acesso às ótimas versões que o grupo fez nos últimos anos, uma boa dica é o disco duplo Garage Inc, lançado em novembro de 1998 pela gravadora Vertigo Records.

O quarteto do metal caprichou e rasparam tudo o que tinham feito entre EPs e lado b, como “Last Caress”, “Die, Die My Darling” dos Misfits e “Am I Evil” do Diamond Head, não satisfeitos ainda incluíram onze novas covers.

DISCO 01

Com destaque para o baladão “Turn the Page” de Bob Seger, que foi a primeira música de trabalho, as novidades não ficam por conta só do gênero metal/punk marca registrada do Metallica, outra versão é “Loverman” em uma versão bem paranóica e envenenada canção de Nick Cave:

There's a devil lying by your side (How much longer)

There's a devil lying by your side (How much longer)

You might think he's asleep but take a look at his eyes (How much longer)

He wants you, darling, to be his bride (How much longer

There's a devil laying by your side (How much longer)

I'll be your loverman

Till the end of time

Till the empires burn down

Forever Amen!

I'll be your loverman!

A banda ainda fez uma homenagem para o Lynyrd Skynyrd com a faixa “Tuesday´s Gone” com solo sereno de guitarra e gaita. A música fez parte do primeiro álbum da banda Pronounced 'Lĕh-'nérd 'Skin-'nérd, lançado em 1973.

DISCO 02

A segunda parte do cd é para as bandas e artistas que inspiraram o Metallica no início da carreira do grupo. O Motörhead é lembrado com quatro faixas: “Overkill”, “Damage Case”, “Stone Dead Forever” e “Too Late Too Late”. O Queen é revisitado com “Stone Cold Crazy” de Freddy Mercury e Brian May, considerada percussora do speed metal.

 
A faixa  “Whiskey in the Jar” faixa nove do primeiro disco é uma tradicional canção Irlandesa, que ganhou o Grammy Award em 1999,na categoria de melhor desempenho.

A música “Whiskey in the Jar” faixa nove do primeiro disco é uma tradicional canção Irlandesa, que ganhou o Grammy Award em 1999,na categoria de melhor desempenho Hard Rock. É sobre um ladrão que depois do roubo é traído pela namorada que o entrega a polícia.

Garage Inc. foi produzido por James Hetfield e Lars Ulrich integrantes da banda e por Bob Rock que já tocou baixo no disco St.Anger de 2003.O disco ficou na segunda posição de acordo com a revista The Billboard em 1998.O renomado fotógrafo britânico Ross Halfin é o responsável pela arte da capa.

Mais de duas horas de duração de puro Heavy Metal para felicidade dos metaleiros, pois quando se fala em covers o Metallica não economiza em fúria e estilo.